Vinicios Torres

Medo do Futuro – 3/3

Alguns anos depois de parar de me preocupar com o medo da volta iminente de Jesus e com o arrebatamento secreto da igreja já tinha desenvolvido uma saudável visão de que devemos estar sempre prontos para prestarmos contas ao nosso Senhor em qualquer tempo. Quando amamos a Jesus nosso desejo é agradá-lo e viver todos os momentos da vida de acordo com o que Paulo nos ensinou, “tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens” (Colossences 3:23). Este é o estilo de vida que está sempre pronto para a Sua volta.

Um dia pesquisando alguns livros sobre o Reino de Deus deparei-me com um livro em inglês que me chamou a atenção. Ele falava que o Reino de Deus foi inaugurado com a vinda de Jesus e que estava sendo estabelecido na Terra através da ação abençoadora da presença e da açao da igreja. Ele apresentava um cenário positivo de futuro, com o evangelho conquistando os corações dos homens através da pregação e do exemplo de vida dos seus seguidores. Esse exemplo de vida era uma forma de viver o evangelho e os ensinos de Jesus.

Era um livro de escatologia pós-milenista. Através dele descobri que o que se ensina na maioria das igrejas evangélicas hoje no Brasil é chamado de Dispensacionalismo. É uma variação do pré-milenismo. O pré-milenismo acredita que o Reino de Deus será implantado na Terra somente na segunda vinda de Cristo, quando sua igreja será arrebatada para encontrá-lo nos ares e descer com Ele para inaugurar um reino que durará mil anos e depois disso todos serão julgados, os vivos e os mortos ressuscitados. O Dispensacionalismo acrescentou a esse sistema, a crença em um arrebatamento invisível da igreja, junto com a ressurreição dos justos, seguido de sete anos de muita tribulação, para só então Jesus retornar com os santos glorificados e inaugurar um reino terreno de mil anos, a partir de Jerusalém como capital. O Dispensacionalismo absorveu também a crença, elaborada nos anos de 1600 por um jesuíta, de que o anticristo seria um personagem que apareceria no futuro. Existe também o amilenismo, que se parece com o pré-milenismo na sua concepção pessimista do futuro, mas que crê que o milênio é apenas uma figura de linguagem, não existindo na verdade um reino milenar.

Fiquei pensando como é que doutrinas tão diferentes tinham sido completamente ignoradas por mim durante mais de vinte anos de vida cristã? Uma pessimista, que me leva a ficar olhando para todos os lados procurando sinais e, paranoicamente, tentando viver uma vida que me garanta não ser deixado para trás. Enquanto a outra, otimista, confiante na vitória final do evangelho e no triunfo do Reino de Deus, apesar de todas as dificuldades, lutas, tribulações e resistência do inimigo. Uma que dá tanta ênfase ao anticristo e à besta que parece que quem está amarrado é Jesus, enquanto outra dá ênfase à autoridade de Cristo e ao poder do Evangelho para transformar vidas que, por conseqüência, têm potencial para transformar a sociedade onde vivem, fazendo o Reino de Deus visível na Terra.

Mas, o que tem esses dois sistemas teológicos a ver com nossa vida no dia-a-dia?

Simples. Aquilo que você crê determina a sua atitude e a sua disposição para a ação. Aqueles que acreditam que tudo vai acabar logo e que as coisas vão ficar cada vez mais ruins antes do fim chegar vêem a escalada do mal como algo inevitável, contra a qual não é possível se fazer nada. Aqueles que crêem que o Reino de Deus sairá vencedor, sabe que isso é uma tentativa do inimigo de atrasar a manifestação plena do deste Reino, e que portanto, tem de ser confrontada com o poder de Deus e com a proclamação da Sua Palavra.

Não é apenas a escolha do sistema escatólogico que você crê que pode limitar as decisões que você toma para sua vida. Espero que você não esteja aceitando nenhuma crença que limite a ação de Deus e o coloque escravo de um sistema ou de uma pessoa. Não esqueça: “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou” (Gálatas 5:1).

Vinicios Torres

Medo do Futuro – 2/3

Depois de tomar a decisão de não mais me preocupar com o futuro e parar de ficar olhando para os tempos e eventos para ver se enxergava evidências de que a volta de Cristo estava próxima, comecei a crescer em entendimento em várias áreas da vida cristã que eu não conseguia ver por estar excessivamente preocupado em ficar descobrindo que passagem profética se ligava ao evento X ou ao acontecimento Y. Hoje olho para aquela época e vejo como é fácil ficarmos fixados em determinado assunto. Ficamos tentando associar tudo a esse assunto e passamos a ver tudo através deste assunto como se este fosse um filtro.

Um dos resultados desta fixação em um determinado assunto é que perdemos o significado real das coisas que não tenham relação com ele, ou exageramos o valor de determinados aspectos justamente por causa da relação com ele. Já contei aqui como uma das mais desastradas decisões financeiras da minha vida foi tomada por causa da compreensão inadequada da doutrina do arrebatamento.

Minha mãe conseguiu uma oportunidade de comprar uma casa, mas teríamos que financiar o saldo em vários anos a frente. Quando ela me apresentou o plano eu, arrogantemente, disse a ela que não adiantava entrar nesse negócio pois não viveríamos para usufruí-lo, já que o arrebatamento da igreja iria acontecer a qualquer momento. Pois bem, o arrebatamento não aconteceu e até hoje vivemos pagando aluguel.

Um dos maiores problemas que este sistema doutrinário impõe sobre os que o adotam é o pessimismo em relação ao futuro. Olham para os textos e só conseguem ver neles catástrofes e destruições antes da volta de Jesus. Lembro-me da alegria desmensurada de uma pessoa quando ouviu a notícia do ataque de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Seu rosto expressando uma satisfação, que para mim só pode ser insana, e ele dizendo: “Assim mesmo, quanto pior ficar mais próximo o fim!”

Este mesmo raciocínio multiplicado pelas igrejas faz com que elas não se envolvam em ação social efetiva, ignorando completamente a realidade do seu contexto social e geográfico. Os cristãos com essa mentalidade raramente se preocupam em melhorar o bairro onde moram, não se envolvem nas ações de cidadania em sua cidade e o máximo que fazem pela escola pública onde os filhos estudam é ficar longe dela para não atrapalhar (mas logicamente reclamam dos professores que faltam ou que ensinam aquelas coisas anti-bíblicas).

Por quê não se envolvem? Por quê não participam? Por quê não se preocupam? Porque foram ensinados que as coisas têm que ficar piores para configurar o cenário para a aparição do anticristo. Assim, com este raciocínio eles pensam que não devem lutar pela melhoria das coisas pois senão estariam atrapalhando o curso dos eventos.

Engraçado, eu leio que Jesus, aquele que nós esperamos ansiosamente a volta, ensinou:

  • Bem-aventurados os pacificadores, mas eu não vejo muitos cristãos envolvidos, ou mesmo orando, pela paz ou pelas negociações de paz entre árabes e israelenses, entre hindus e cristãos, entre sihks e paquistaneses, ou pelas muitas disputas tribais na África.
  • Bem-aventurados os pobres de espírito, o que mais vejo hoje é a reinvindicação de direitos, a busca desenfreada de riquezas sem objetivo e propósito justo e a ausência crônica da igreja nas ações de erradicação da pobreza, das doenças endêmicas, da desnutrição, ou seja, do esforço de mudança da realidade.
  • Bem-aventurados os que têm sede de justiça, e não vejo nada mais do que cristãos que o máximo que fazem ao saber das injustiças cometidas é soltar um sonoro “Oh! que pena para ele, ainda bem que não foi comigo!”

Quando leio Jesus ensinando essas coisas não consigo compreendê-las em um contexto de medo do futuro ou com a idéia de que não valerá a pena. Pelo contrário, ouço a voz de Paulo a dizer sonora e claramente “E não nos cansemos de fazer o bem, pois a seu tempo ceifaremos, SE NÃO DESFALECERMOS.”

Ou seja, permaneça FIEL até a morte, não importando as circunstâncias ou condições do futuro. A coroa da vida está a sua espera.

Vinicios Torres

Vinicios Torres

Medo do Futuro – 1/3

Eu me converti a Cristo no início da década de 80. Este foi um período marcado por muitas especulações acerca do fim do mundo e da volta de Jesus, embaladas pela popularidade do livro de Hal Lindsey, “Agonia do Grande Planeta Terra”, em que ele oferecia um cronograma detalhado dos últimos dias do mundo, o que segundo ele aconteceria em pouquíssimos anos.

Praticamente no país inteiro, o assunto mais popular nas igrejas era acerca do arrebatamento iminente da igreja. Discutia-se acerca dos sinais e das evidências que cada dia pareciam mais abundantes. Naqueles dias, se um pregador quisesse fazer sucesso, bastava incluir na sua agenda de pregações uma mensagem acerca do arrebatamento. Se ele tivesse um seminário de vários dias sobre os últimos tempos e o Apocalipse, seria reputado como especialista em escatologia.

Como novo convertido e ávido por aprender as coisas de Deus, eu comia e bebia abundantemente de qualquer fonte que pudesse me esclarecer os mistérios da Palavra de Deus. Cheguei a decorar nomes de povos e de lugares, detalhes históricos; sabia de cor os nomes dos dez países que fariam parte do Mercado Comum Europeu, que seria a sede do governo da besta e do seu anticristo.

Mas havia algo que não me dava paz. Cada vez que um pregador falava sobre o arrebatamento, ele sempre terminava com um apelo manipulador, induzindo medo nas pessoas, colocando sobre elas o peso de que se elas não estivessem perfeitas no momento do arrebatamento elas seriam deixadas para trás. Consigo lembrar claramente as muitas vezes em que ouvi nesses apelos a pergunta: “Se Cristo voltar esta noite, você está preparado?” (Engraçado, para estes pregadores Cristo sempre volta a noite…)

Eu sempre ia dormir com o coração pesado, pois tinha a desagradável sensação de não ser suficientemente perfeito para ser arrebatado. Após essas pregações passava dias sobressaltado com medo de ser deixado para sofrer nas mãos do Anticristo. Eu orava pedindo a Jesus que adiasse a sua volta até que eu conseguisse me aperfeiçoar.

O tempo foi passando, aquela sensação de inadequação persistindo, mas eu fui percebendo que algumas coisas que eu a acreditava que deveriam acontecer não estavam acontecendo. Quando o Mercado Comum Europeu chegou a 12 países, e havia planos de aumentar transformado-se em Comunidade Européia, eu percebi que alguma coisa estava errada naquilo que eu cria. Comecei a perceber que havia fundamentado a minha fé em um sistema imperfeito. Durante algum tempo fiquei sinceramente perdido sobre o que eu deveria crer em relação aos últimos tempos.

Um dia, lendo o Apocalipse, observei uma frase que Jesus disse para uma das igrejas. Ele terminou seu discurso dizendo: “Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida” (Apocalipse 2:10). Neste dia eu tomei a decisão de não mais me preocupar com o futuro, no sentido de ficar olhando por sinais que me avisassem se a volta de Jesus está próxima ou não. Eu orei pedindo a Deus que me capacitasse a permanecer fiel independentemente das circunstâncias. Depois disso fiquei anos sem ler ou estudar qualquer coisa que se referisse a escatologia. Saiu de meus ombros o peso que sentia pela sensação de não estar pronto. Sabia que o que eu precisava fazer era andar em santidade e procurar crescer a cada dia em comunhão com Deus.

Ontem, lendo Atos dos Apóstolos percebi que essa foi justamente a atitude que o Senhor Jesus esperava dos seus discípulos (Atos 1:4-6). Ao ordenar aos discípulos que fossem para Jerusalém e lá esperassem a descida do Espírito Santo, estes lhe perguntaram se nesta oportunidade ele restauraria o reino político de Israel. Jesus, porém, diz aos seus discípulos que não competia a eles se preocuparem com os tempos que estavam reservados a Deus. Ou seja, os discípulos deveriam preocupar-se em obedecer a Deus e deixar a cargo de Deus a responsabilidade de administrar o tempo em que as coisas deveriam acontecer.

Em relação ao futuro, a nossa única responsabilidade, como discípulos de Jesus, é a de obedecer ao seu último e expresso mandamento, que nós chamamos de a Grande Comissão: “Ide por todo mundo e fazei discípulos de todas as nações, ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ensinado”. Ponto.

Ainda hoje eu vejo muitas pessoas, igrejas inteiras até, escravizadas pelo medo de serem surpreendidas em um momento em que elas não estão prontas. Uma das tarefas do Espírito Santo é, justamente, a da santificação. Se nós permitirmos, ele agirá em nós transformando-nos cada vez mais a imagem de Cristo, e nos preparando para o grande dia quando nós veremos o nosso Senhor face a face.

Não precisamos temer este dia, pelo contrário, devemos desejar ardentemente que este dia chegue o mais rápido possível.

Vinicios Torres